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quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

Um estranho Abutre

Sou um homem estranho no universo benfiquista: costumo ir aos jogos do Benfica. Não sei se isso fará de mim uma espécie de ave rara entre os adeptos, mas de facto há que perguntar com legitimidade: o que é que me terá dado para ter esta pancada? Deve ter sido por uma vez ter passado em Estarreja e sentido aquele odor a enxofre, sim, foi esse o ponto de viragem na minha vida: de bebé de sofá passei a homem de estádio. O que a poluição não faz à tola de um gajo.

E digo mais: não só vou ao estádio como apoio a equipa! Fenomenal, não é? E ainda - esta vocês não vão acreditar - tenho o estranhíssimo hábito de nunca assobiar os nossos jogadores. Eu sei, sou um perfeito anormal. Já me chamaram nomes e tudo: «então não assobias? Nem que seja só um bocadinho? Olha ali aquele cepo do Cardozo, faz-te homem, caralho!», e eu quase envergonhado cantando Ben-fi-ca, Ben-fi-ca, procurando chamar outros para a minha cantoria e os outros mandando-me baixar o lombo porque, já se sabe, carne de porco não é transparente.

Chamo-me José Abutre, tenho uns quantos anos, nasci numa certa cidade, fiz alguns filhos, gerei netos, há bisnetos com o meu apelido por esse mundo, desconheço o seu paradeiro. O apelido vem de andar por esse país a dizer mal do orelhas - não gosto dele, cheira a mofo, tem ar de parvo, é sabichão mas não é a favor do Benfica. Mas eu sei que não tenho razão nas minhas críticas porque conheço bem o meu intelecto - já fui intensamente estudado em laboratórios da NASA, nunca tinham visto coisa igual. Chamaram-me de «exemplo do que não deve ser um humano» e depois enviaram-me para casa a nado. Demorei dois anos a chegar ao Estádio da Luz, todo encharcado, com uma barbatana de tubarão na boca e um cachecol do Benfica ao pescoço.

Criei uma rulote de bifanas, depois de secar o trombil com uma toalha que comprei na Feira da Golegã de um cavalo de pé só com uma pata no chão a relinchar contra um toureiro malvado. Chamaram-me logo de Vice-Presidente das bifanas, pelo meu ar sério, aprumado, quase ministro.

Uso cueca Benfica e meias com a cara do Barnabé. Tenho dois cães: um chama-se Prego; outro Papo-seco. Quando se juntam, vem-me logo a mostarda ao nariz. Sou escorreito, quase higiénico, vou atrás do Benfica até ao fim do mundo ou só até ao fim da rua, depende se durmo ou não no Alto dos Moinhos.

Há dias em que me encosto às portas do estádio e lambo o chão a ver se apanho o sal das memórias. Costumo ir para a zona onde antes era o Estádio fingir que ainda lá estou a ver um jogo do Benfica. Sou José Abutre, um homem estranho. E não gosto nada de ver marmelos de outros clubes a mandar no meu. Qualquer dia chego a Presidente e mando uma equipa desratizar aquela merda toda.

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